Tinta Ferreira, o presidente da câmara, e José Luiz de Almeida e Silva, o director |
Ninguém está isolado no mundo e cada pessoa tem direito a ter e a manter as suas relações pessoais, de amizade, de conveniência ou de oportunidade social independentemente das posições que ocupa. Exigir o contrário seria absurdo.
Diferente é, no entanto, se as relações pessoais de alguém que ocupa um cargo de notoriedade e de influência públicas permitem que se gere a dúvida (e isto na mais benevolente de todas as perspectivas) sobre a objectividade ou a independência de opinião dessa pessoa. Não é só ela que fica mal. É também a entidade onde essa pessoa exerce a sua influência directa e/ou dirige.
O economista caldense José Luiz de Almeida e Silva é com certeza um profissional experiente, soube elevar o jornal que dirige (a "Gazeta das Caldas") a um patamar interessante e tem uma perspectiva sobre Caldas da Rainha (talvez mais sobre a cidade do que sobre o concelho).
Tinta Ferreira, que até pode ser um jurista excepcional e um funcionário público de grande valor profissional, é presidente da câmara desde Setembro do ano passado. Nos sete meses que já passaram não houve coisa de visibilidade pública que não tivesse corrido mal, a começar pelas obras da Avenida 1.º de Maio, que paralisaram essa parte da capital do concelho durante muitos meses... só para alargamento dos passeios.
E, no entanto, na coluna de crítica da "Gazeta das Caldas", onde outras personalidades públicas têm sido criticadas a um nível que roça o insulto pessoal, Tinta Ferreira nunca apareceu. A "Gazeta das Caldas" refere-se, de passagem, aos problemas causados pela sua gestão municipal mas sem nunca citar o alcaide. Já era o suficiente para suscitar muitas e variadas dúvidas.
A glorificação "coreana" do grande líder caldense
Este quadro, já de si bizarro, chegou agora a um ponto de paroxismo quando, na edição de ontem, a "Gazeta" põe Tinta Ferreira em seis (6) fotografias em outras tantas notícias. O presidente da câmara pode ter tido este protagonismo público durante uma semana mas há nisto algum exagero.
E, o que é mais sintomático, numa das notícias, o presidente aparece com o director da "Gazeta" a propósito do estudo prospectivo sobre as termas até 2035 (a que já aqui nos referimos), que é dirigido por José Luiz de Almeida e Silva.
Na notícia (ilustrada com a fotografia que aqui reproduzimos), José Luiz de Almeida e Silva não é identificado como director do próprio jornal mas como "especialista em análise prospectiva".
Isso não é suficiente, no entanto, para separar as águas. José Luiz de Almeida e Silva não terá seguramente uma dupla personalidade; enquanto está a dirigir a "Gazeta" está decerto a pensar no futuro das termas e enquanto estuda o futuro das termas está decerto a pensar na edição seguinte da "Gazeta".
A lógica de não citar a sua função de director de um jornal nasceu com o próprio jornalismo (o princípio é este: não se fala na coisa e a coisa não existe) mas é apenas uma expressão do pensamento mágico e, numa sociedade pluralista e de liberdade de imprensa, não ilude a realidade: o facto de o presidente da câmara entregar um estudo sobre o que deve encarar como a maior decisão da sua vida política ao director de um dos dois jornais do concelho.
É aqui que se aplica o princípio (extensivo ao jornalismo) de que "em política, o que parece é".
E mesmo que a multiplicação de fotografias do grande líder autárquico se revista apenas por acaso de um carácter "coreano" ou que o pensamento de José Luiz de Almeida e Silva sobre as termas seja completamente isento, a dúvida instala-se, germina, desenvolve-se.
Ela não atinge apenas os dois homens e o seu relacionamento institucional mas a credibilidade do próprio jornal, que vai ficando cada vez mais identificado (em notícias, opiniões editoriais e inevitavelmente as tendências dos seus jornalistas) com o PSD de Caldas da Rainha que dirige nesta altura a Câmara Municipal.
É pena que José Luiz de Almeida e Silva não veja que, prospectivamente, isto só vai prejudicar um jornal que, pelo seu passado, merecia outro futuro.
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Adiar para não decidir - Costuma dizer-se que quando um órgão de poder não quer tomar uma decisão cria um grupo de trabalho ou encomenda um estudo. A Câmara Municipal de Caldas da Rainha tem em seu poder, há mais de um mês, a proposta do Governo sobre o Hospital Termal. Mas, em vez de decidir (e tem legitimidade para o fazer mesmo que não tenha dinheiro ou capacidade de pensar), a câmara encomendou um estudo prospectivo.
Continuem os defensores do Hospital Termal a pensar que, assim, as termas têm futuro e a desilusão ainda lhes vai doer mais.
4 comentários:
Boa análise!
Obrigado!
Também acho que dum ponto de vista prospectivo não se augura nada de bom (v. o post mais recente do blogue). O que acontece é que esta Santa Aliança começa a ser o caldinho que os vai perpetuar, um na prospectiva de vir a ser vereador, o outro na prospectiva de se reeleger e, quando não for mais possível, dar o salto para outros voos. E, para mais, em terra de cegos, estes senhores aparecem com o olho bem aberto (também prospectivo) para a coisa.
Agradeço o seu comentário e devo dizer que não tinha pensado na hipótese de o director do jornal querer ser vereador e de estar a agir com esse objectivo. É muito plausível, no entanto, até porque a câmara municipal terá mais futuro do que o jornal...
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