"Isto é um bocado medieval", diz-me, admirada com o que vê, uma das jovens que está a fazer de bilheteira, no terceiro posto de venda de bilhetes de ingresso no Mercado Medieval de Óbidos.
Tem o meu Cartão de Cidadão enfiado num aparelho que lhe diz, surpresa das surpresas, que eu resido no concelho de Caldas da Rainha e não no concelho de Óbidos.
Não compreendo o motivo da sua dúvida porque, se lhe entreguei o cartão, foi para beneficiar apenas do desconto de uns modestos 2 euros que me garantem os mais de 65 anos.
Mas este desconto, convenientemente desaparecido dos preçários expostos nas bilheteiras, parece ser usado por pouca gente. Quem apresenta as respectivas identificações, para poder entrar à borla, são os residentes em Óbidos e daí a surpresa da minha interlocutora.
Nem a ela nem à colega ao lado lhe ocorrem uma pergunta simples que deviam fazer ao cliente (o motivo do desconto) ou a simples verificação da data de nascimento. Talvez por não saberem ler.
Esta penitência diante da terceira bilheteira do Mercado Municipal de Óbidos (a primeira estava apinhada de gente e na segunda foi necessário esperar para outra criatura da mesma espécie me rejeitar a apresentação do Cartão de Cidadão) foi apenas um dos passos difíceis do acesso ao recinto onde não ia, salvo erro, desde 2018.
Estacionar (com um parque gerido pelos Bombeiros de Óbidos que cobram a preços de luxo), percorrer a comprida Rua Direita que leva ao Mercado e depois passar mais de quinze minutos à espera de poder comprar os bilhetes foram as outras etapas desta via sacra.
E para quê? Valeu a pena?
Não.
Interrompido em 2020 e em 2021, à conta dos confinamentos alarmistas da pandemia, o Mercado Municipal de Óbidos podia ter melhorado: melhor organização, melhores espaços, melhores ofertas de paragem e de zonas de alimentação, melhores actividades de comércio, melhores exposições e iniciativas temáticas. E não me refiro aos espectáculos porque nem consegui ver nenhum.
Depois de mais de meia hora para tentar entrar, que atirou a chegada à zona das refeições (um propósito legítimo) para depois das oito e meia, há o calvário de tentar encontrar lugar a uma mesa e de ir buscar comida.
O acaso levou-nos à área da Associação de Caçadores das Freguesias de São Pedro, Santa Maria e Usseira (Taberna dos Caçadores), uma das associações que gerem restaurantes improvisados, que tinha um dos seus dinâmicos membros a assegurar o serviço de mesa e um entrecosto bem assado e saboroso. Isto e os sempre divertidos Os Alquimistas, com os seus licores espirituosos, foram os únicos pontos altos de uma jornada melancólica.
Escrevi aqui que o Mercado Medieval de Óbidos se havia transformado em mais uma "feira de tasquinhas".
Dez anos depois, os seus organizadores (a nebulosa empresa municipal Óbidos Criativa e a Câmara Municipal de Óbidos) nada fizeram de novo. As multidões que atraem (e que fazem do certame uma iniciativa muito rentável, à margem de impostos) devem dar-lhes a confiança necessária para acreditarem que estão a fazer um bom trabalho. Só que não estão.
Óbidos merece uma visita (mas sem a confusão do seu inglório Mercado Medieval), as lojas ao longo da rua principal são sempre interessantes (apesar dos preços "turísticos" que praticam) e até pode haver uma oferta interessante de comes e bebes. Mas não nesta época.
No regresso, já a caminho da saída, ainda parei numa livraria da moda, na Rua Direita, que parece chamar-se "Livraria e Mercado Biológico", onde se vendem livros (é livraria...) e mercearias várias.
Mas, significativamente, o vasto salão dos livros estava vedado e só restavam as mercearias. É lógico: na Idade Média, o povo não sabia ler...
Tasquinhas Medievais de Óbidos, pra inglês ver... |
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