domingo, 17 de março de 2013

Fitas


Como toda a gente viu, vê ou há-de ver filmes, o cinema é daquele tipo de assuntos de que toda a gente sabe tudo o que há a saber e mais um par de botas.
Graças a isso, instala-se o disparate e entramos em mais um domínio do reino da irracionalidade. Pensando bem, só admira que tenha demorado tanto tempo.
Da extraordinária e repetitiva excitação das instâncias oficiais da cultura (e agora do turismo) pela possibilidade de haver filmes estrangeiros rodados em Portugal já aqui falámos, e segundo o semanário "Sol", aguarda-se com expectativa que produtores indianos venham rodar "oito a dez minutos" de longas-metragens, numa espécie de "remake" da rentabilidade comercial das aparições de Fátima.
A lógica é esta, simplista, sem sequer se considerar que poderia haver vantagem em ajudar a criar condições para a pós-produção, benéficas para as produções estrangeiras e para o que poderia vir a ser a indústria(zinha) audiovisual do nosso país. Basta-lhes virem rodar umas cenas, mostrar dois ou três bilhetes-postais de paisagens portuguesas e largarem a massa em bens e serviços temporários.
O exemplo com que se acena para esta espécie de fita é, no entanto, erróneo: "Comboio Nocturno para Lisboa", que agora se estreia, tem a capital portuguesa no título e como cenário e um dos co-produtores é Paulo Trancoso, com vasta experiência e contactos no meio.
Com o Governo a repetir vários erros já cometidos, o sempre mediático Bloco de Esquerda não se quis ficar em segundo lugar no torneio dos disparates e tivemos metade da sua liderança bicéfala a derramar lágrimas pelos 212 concelhos portugueses sem salas cinemas, o que (nas miríficas contas bloquistas) se traduz em 3,8 milhões de portugueses sem cinema.
Segundo o "Expresso", a dirigente do BE terá mesmo exclamado: "40 por cento da população portuguesa não tem acesso ao cinema, ou seja, não pode ver nada!"
"Não pode ver nada"?! Seria bom, por exemplo, que o BE, se conseguisse ir além da espuma das ondas, reflectisse um pouco sobre o fenómeno da pirataria e dos "downloads" ilegais de filmes (e de outros produtos culturais). Ou sobre a evolução do mercado português da distribuição e da exibição de cinema. Ou sobre o audiovisual nacional. Ou, ainda, sobre o papel dos seus camaradas jornalistas na (des)promoção do cinema.
E já agora (em formato de declaração de interesses): no concelho onde vivo, há um pequeno conjunto de salas de cinema, que são tão desconfortáveis que é penoso frequentá-las e onde só muito raramente vou.
Também não faço "downloads" de filmes porque, mesmo que quisesse tirar cópias manhosas e sem qualidade da internet, nem sequer tenho "banda larga" para o fazer.
Portanto, vejo filmes em casa, alugados no único videoclube que ainda resta na cidade mais próxima ou então comprados.
Ou seja, na versão bloquista, eu "não posso ver nada!"...

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