O anunciado (em linhas muito gerais e ainda indefinidas, uma semana depois) "plano de apoio" do Governo à imprensa mostra que, na prática, tudo se resume ao dinheiro... e às boas intenções.
Comecemos, neste último apontamento sobre o "plano", pelo dinheiro.
Na perspectiva de quem gizou o "plano", o problema da imprensa não está na sua adequação aos interesses do potencial público do produto que vendem (ou que tentam vender), mas na sua incapacidade de chegar ao público. Ou seja: a imprensa escrita está bem à vista em muitos sítios, a imprensa televisiva é livre e a impresa on line tem os seus temas e títulos praticamente bem visíveis, com os pormenores reservados a acessos pagos em muitos casos, mas... o público é incapaz de lá chegar. Portanto, há que atirar o produto aos clientes para que eles se interessem. E dar dinheiro às empresas para o fazerem.
Vejamos este ponto do "plano":
É simpático querer levar "publicações periódicas" para "zonas de baixa densidade populacional" e a "todos os concelhos do País". Mas... que publicações periódicas? Jornais? Revistas de palavras cruzadas e similares? Revistas "cor-de-rosa"? E há público que as queira comprar? E parte do público que possa estar interessado não será já beneficiado pelo desconto governamental nas assinaturas digitais?
É simpático querer dar "formação empresarial" aos órgãos de comunicação social regionais e locais. Mas pensar assim significa ignorar que uma grande maioria das empresas proprietárias desses "OCS" já aprendeu a gerir o seu dia-a-dia ao longo dos últimos anos e que também é por isso que as suas receitas, quando as têm, não têm a ver com as vendas dos seus jornais a consumidores individuais, aproveitando os apoios, directos e indirectos, das câmaras municipais, das outras empresas e de quem tem dinheiro e interesses.
É simpático querer "valorizar" as rádios locais, mas será conveniente, primeiro, saber se têm quem as ouve. A tradição de ouvir rádio perdeu-se, em parte. Quem quer "apoiar" a imprensa sabê-lo-á?
E isto tudo será feito como? Com dinheiro, naturalmente. Para todas as empresas, ou só para algumas? E critérios, haverá?
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E quanto às boas intenções... Imagino como será interessantes vê-las a serem exercitadas nas salas de aulas.
A formulação, em abstracto, faz pensar em verdadeiras lavagens ao cérebro, do refinado "Novo Plano Nacional de Literacia Mediática" ao "combate à desinformação" (quem é que a define?...), passando pela redução do pagamento das assinaturas digitais, supõe-se que para a população em geral, e pela oferta de assinaturas ("de jornais digitais generalistas", portanto, apenas de alguns) aos alunos do ensino secundário. Imagina-se o interesse que os jovens terão em ler o "Diário de Notícias" ou o "Expresso"...
Este tipo de boas intenções, sustentadas pelo dinheiro dos nossos impostos, mostra que o Governo pretende, essencialmente, controlar a informação e delegar nas administrações das empresas do sector a gestão dos conteúdos que garantirá as verbas que irá distribuir... mas não a todos.
Não é difícil pensar que um número significativo dos destinários deste "apoio" fará tudo para asseguar que o dinheiro é para eles.
E não deixa de ser curioso verificar o silêncio dos jornalistas perante este plano de controlo dos órgãos de comunicação social.
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