Aquilo que em termos políticos se chama “esquerda” tem-lhe associados certos princípios, que até podem ser considerados fundadores, como a luta pela justiça e pela igualdade, a recusa dos privilégios que ponham em causa os benefícios da população em geral, o controlo dos favores feitos pelos políticos aos interesses económicos e, numa perspectiva mais abrangente, o respeito pela democracia.
Não seria de esperar que, por exemplo, a esquerda, organizada ou não em partidos, aceitasse (e impulsionasse, até) acontecimentos como uma mitigada melhoria salarial da função pública à custa do sector privado e uma verdadeira isenção fiscal para um sector comercial, que nem sequer tem o alibi da cultura, e deixasse passar em branco a promiscuidade suspeita entre uma das maiores empresas nacionais e meia-dúzia de governantes nacionais e locais, uma vaga de despedimentos no banco do Estado e ainda impedisse o debate destes e outros temas na Assembleia da República.
Estes exemplos são apenas uma parte do que o actual governo (PS-PCP-BE) tem feito.
Hoje, oito meses depois do golpe de Estado parlamentar de Novembro do ano passado, há muito mais e nada dignifica em termos políticos os dois partidos que, declarando-se de esquerda, se confundem com as velhas práticas do PS de Soares e de Sócrates. E muitas das decisões deste governo, que o BE e o PCP na prática subscrevem sem qualquer distanciação honesta, teriam sido alvo da sua fúria se fossem do anterior governo.
O PCP e o BE mudaram. Ou revelaram a sua verdadeira face, a “fachada socialista” a que Álvaro Cunhal aludiu.
A esquerda, para eles, é isto: o apoio incondicional aos piores tiques de um PS que nunca foi capaz de deixar bons legados governativos.
O PCP e o BE venderam-se e venderam os seus valores para gozarem dos favores de um governo de trapalhadas e de situações duvidosas. E talvez para competirem em futuros compromissos eleitorais, depois de terem tomado o gosto ao “arco da governação”.
Já outros o fizeram e outros ainda continuarão a fazê-lo. Mas nunca o haviam feito, e de modo tão organizado e tão consciente, os que sujam a esquerda por a terem na boca mas não nos gestos.
O PCP e BE prostituíram-se, com a suprema hipocrisia de não precisarem de congressos para aplicarem esta versão tão torpe de um novo “eurocomunismo”.
E até que ponto é que esta esquerda prostituída vai continuar a ter militantes, simpatizantes e eleitores?
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