Há duas semanas e meia morreram 64 pessoas num incêndio no centro do País, que deixou um rasto de prejuízos, feridos (mais de 200) e devastação como nunca antes se vira. Os responsáveis do Ministério da Administração Interna, do topo à base, andaram descontrolados. O Presidente da República disse que era o melhor que se podia fazer e depois tentou emendar a mão. Foi, praticamente, a última vez que apareceu em público o ainda primeiro-ministro. Os seus parceiros PCP e BE perderam o pio, mais ou menos ao mesmo tempo.
Uma semana depois, o primeiro-ministro mandou fazer um estudo de opinião, achou que toda a gente estava satisfeita com ele e pirou-se para férias, para uma ilha espanhola. Entretanto, os mortos continuaram mortos, o rasto de destruição continua à vista de todos e o Presidente da República começou também a perder o pio. A ministra da Administração Interna fez saber que o incêndio florestal tinha sido grande, verteu umas lágrimas parlamentares e deixou que se generalizasse a guerra civil entre os organismos sob o seu comando.
De um paiol militar desaparece, neste rescaldo, uma impressionante quantidade de material de guerra que dá, entre outras coisas, para guerrilha urbana, atentados terroristas e crimes (mesmo) violentos. O ministro da Defesa disse que já tinha havido roubos piores, o chefe do Estado-Maior do Exército afasta meia dúzia de oficiais intermédios e fica todo contente. Mas o oficialato reage mal ao afastamento dos seus camaradas sem culpa formada. O comandante-chefe das Forças Armadas, que é o Presidente da República, perde de vez o pio.
O primeiro-ministro continua de férias e em silêncio. O PS, formalmente, diz que a culpa de tudo é do Governo anterior, apesar de ter sido o actual Governo que já aprovou dois Orçamentos de Estado (com sortes em toda a máquina do Estado… e nos dispositivos de segurança da Defesa). O PCP e o BE continuam mudos. O Presidente da República suspira que só ele é que não pode ir de férias e diz que trata dos assuntos domésticos com o ministro dos Negócios Estrangeiros, como substituto do veraneante, que fez saber que andava a tentar recuperar o material roubado, talvez através do OLX.
Entretanto, o exame de Português é previamente conhecido por uma parte dos alunos sujeitos a exame, que com isso terão maiores possibilidades de obter melhores notas para entrarem no ensino superior, ao contrário dos seus colegas que de nada souberam. Para o ministro da Educação, que não gosta de exames nem de avaliação de conhecimentos, está tudo bem.
E o primeiro-ministro, não fosse alguém pensar que fugira, até se viu obrigado a confirmar que tinha ido de férias.
Este tipo de descontrolo costuma acontecer no final dos ciclos governamentais e é habitual chamar-se-lhe “fim de regime”. Este governo tem ano e meio de existência. Soube governar pela negativa. Não sabe governar pela afirmativa. Nem tão pouco gerir crises. Há quem considere o primeiro-ministro um sobrevivente. É, sim, um fugitivo, incapaz de dar o peito às balas. E nisso está bem acompanhado.
(Publicado no Tomate.)
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