A ordem de enumeração é arbitrária, até porque o tom é do mais monocórdico que existe: CNN de cá, "Expresso", "Público", "Observador", as outras televisões... A informação sobre a crise ucraniana é, para a grande maioria dos órgãos de comunicação social nacionais, uma informação parcial, tendenciosa e distorcida. E toda igual.
O que se passa no terreno, na frente de combate das regiões onde as forças armadas da Rússia vão obrigando as forças armadas da Ucrânia a recuarem, diariamente, é o melhor espelho dessa informação enviesada. Nenhum desses órgãos nos diz o que vai acontecendo. E o que vai acontecendo é, subjectiva e objectivamente, desfavorável à Ucrânia.
Se o sentido fosse o inverso, se tivéssemos as forças armadas da Ucrânia a obrigarem as forças armadas russas a recuar, haveria notícias (e de tom jubilatório). Mas não é o caso e... não há notícias.
Estou a falar de notícias e não de opiniões. E, mesmo aqui, o panorama é semelhante. Ainda sobrevivem, e gabo-lhes a coragem e a determinação, comentadores que não têm medo de expressar as suas opiniões e de contarem o que sabem (e, entre eles, destaco, por estima, consideração e admiração pessoais, o major-general Carlos Branco), mas o tom geral dos comentadores é acriticamente pró-ucraniano.
Mas o tom, nas notícias, devia privilegiar a objectividade. Devíamos ter informações em concreto sobre o que se passa no terreno, no campo de batalha mas também no palco político. Se há jornais, realmente relevantes, de outros países que são capazes de o fazer, porque é que os portugueses não o fazem?
Haverá quem possa dizer que é tudo uma questão de convicção, que os que mandam na imprensa acham que há um adversário "bom" e um adversário "mau", ou que um é "justo" e que o outro é "injusto". Pode ser isso, mesmo contras as regras de objectividade do jornalismo? Pode ser, mas não é. A convicção de chefes e directores, nesta matéria, está mais ao nível da fé. Acreditam. É uma variante do pensamento mágico. E será só uma questão de fé?
A informação, por vezes tão igual, não pode deixar de ter, pelas regras comuns de experiência, a mesma origem. E ela há de ser do domínio das empresas de comunicação, muito mais do que das agências noticiosas (que também devem "beber" dessas mesmas fontes). É muito natural que o governo de Kiev canalize parte do dinheiro que vai recebendo para fazer passar as informações que lhe dão jeito e por intermédio de empresas do sector. É o seu papel num mercado livre e, para o bem e para o mal, desregulado.
O pior é depois: e se, com as informações convenientes, o governo de Kiev estiver a pagar também aos órgãos de comunicação social e a quem neles trabalha? Poderá haver quem, lendo estas linhas, considere que esta hipótese é uma fantasia. Mas o que está a acontecer é uma guerra e, nestas guerras do nosso tempo, todas as possibilidades estão em aberto.
Porque, convenhamos, a fé não explica tudo.
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O "Observador", onde esta fé substituiu a capacidade de raciocínio que alguns profissionais chegaram a ter noutras "vidas", tem as suas opções bem claras e essas opções passam ao lado das notícias e da verdade sem problemas de consciência.
Esta publicação on line, que cheguei a assinar, não hesita, como tantos outros, em dar destaque à figura do presidente ucraniano (que há de estar a beneficiar do trabalho de especialistas de relações públicas e de comunicação), que foi comprar à Getty Images. Mas depois, num contraste ostensivo ignora as chocantes fotografias dos novos recrutas com que o comediante-presidente quer ganhar a sua guerra (e a que eu aqui me referi). E não há de ter sido por falta de dinheiro para as comprar...