A faixa de terreno em que esta construção assenta é exígua, sobretudo para uma estrutura que é quase, insolitamente, quadrada.
À frente e atrás quase nem tem espaço, aos lados tem mais espaço. Também não existiam aqui quaisquer ruínas de uma casa anterior e este pormenor é, parece-me, importante, porque, pelo menos há algum tempo, não era possível construir de raiz nesta zona.
E esta zona é a Serra do Bouro, no concelho de Caldas da Rainha, a cerca de dez quilómetros da capital do concelho e com a costa atlântica ao alcance de minutos.
Há meses, depois de arrasadas a vegetação e as árvores existentes, foi construído um muro improvisado que poupa, felizmente, o que parece ser um caminho público.
Depois começaram a pôr estruturas de madeira.
Depois foram as paredes, em dois planos com uma placa que parece oleado entre eles, e o telhado, na horizontal com um cano verde a espreitar por um buraco, talvez para escoar a água da chuva.
Finalmente, a coisa ficou montada.
A coisa é, na aparência, um barracão. Um barraco, melhor dito. Um armazém. Ou uma casa disfarçada de barracão. O interior tem várias divisões, a parte que está encostada ao muro tem uma porta de entrada. A parte oposta tem uma varanda, que dá directamente para outra casa onde, se abrirem as janelas, exporão a sua vida íntima aos habitantes do barracão.
O barracão, estranhamente, não tem janelas para apanhar o sol da manhã ou o sol da tarde. Não é a primeira vez que vejo isto: os amantes destes caixotes não percebem, normalmente, de onde vem o sol. Ou, então, são os habilidosos que lhes vendem estes enjoos urbanísticos que nem querem saber.
Além disso, o contraste com a paisagem e as outras habitações próximas é chocante. A coisa parece saída dos bolsos de um qualquer pato-bravo chico-esperto que quer exibir a modernidade de uma casa de madeira que, no entanto, é de uma mediocridade estética verdadeiramente merdosa.
O barracão não é, apenas, estranho nesta perspectiva. É estranho em todo o seu processo de construção. E não é só a dúvida sobre a viabilidade da construção.
É, ainda mais, a ausência do aviso camarário de que a obra se encontra licenciada. É a falta de ligação à rede eléctrica e à rede de água. É o modo apressado como a coisa foi feita. É, ainda, o violento contraste com a paisagem envolvente.
Não sei, naturalmente, qual a situação desta coisa. Mas há uma coisa que eu sei e que, possivelmente, ainda vigora: há municípios onde a burocracia urbanística e das obras particulares, a justificada e a
injustificada, se contorna de uma maneira... e não, não é só essa em que o leitor estará a pensar.
O truque é este: se os regulamentos impedem construções de tijolo, definitivas, o melhor é pôr no terreno construções que podem ser consideradas provisórias, em madeira, por exemplo. Assim, os serviços municipais já não podem opor-se e a inércia, o tempo que vai passando e um fiscal mais
"amigo" acabam por criar uma espécie de deferimento tácito a que depois facilmente se juntam as ligações à rede de água e de electricidade.
Acredito que seja isto que está a acontecer. E, pior ainda, que a Câmara Municipal de Caldas da Rainha deixe passar a coisa. Esteticamente, os seus valores são zero e legalmente... é impossível não pensar que vale tudo.
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