Se o resultado definitivo das eleições presidenciais deste
domingo vai depender dos votos dos eleitores, nesta fase final de uma campanha
em que há dez candidatos é possível fazer previamente um apuramento das
vitórias e derrotas. Ou, mais exactamente, da vitória e das derrotas e em
termos políticos.
Porque, mesmo sendo as candidaturas individuais, as mais
destacadas estão estribadas em intervenções políticas e partidárias e as
outras, ditas independentes, estão naturalmente estribadas em projectos
políticos de natureza pessoal e, mesmo num caso, com uma ambiciosa perspectiva
partidária muito clara.
Poder-se-á dizer que esta abordagem é irrealista porque os
votos não estão deitados nem contados mas, à luz das sondagens conhecidas e das
regras comuns de experiência política, alguém duvida de que já existe um
vencedor antecipado e que o protagonismo dos outros nove não é mais, onde não
há “bluff” e a vontade é sincera, um simples “wishful thinking”?
Tino de Rans, Cândido Ferreira e Gonçalo Sequeira
Comecemos pela maioria e pelas três candidaturas unipessoais
que muito provavelmente receberão o menor número de votos: Tino de Rans,
calceteiro e presidente de uma junta de freguesia, Cândido Ferreira, médico, e
Gonçalo Sequeira, psicólogo e/ou comercial, salvo erro.
Pensarão realmente estes três que têm alguma possibilidade de
obterem um número suficiente de votos e uma percentagem significativa na
distribuição dos votos para conseguirem vencer a eleição presidencial? Será
que, no seu íntimo, algum destes candidatos é capaz de garantir às imagens
reflectidas nos seus espelhos que vai ser mesmo presidente?
Tino de Rans deve conseguir notoriedade suficiente para se
candidatar à presidência da sua câmara municipal, Cândido Ferreira talvez
queira deixar esta marca no seu percurso para memória dos seus descendentes e
Gonçalo Sequeira talvez confie que a sua notoriedade lhe dê mais clientes.´
A sondagem que na semana passada saiu no “Expresso” dá a cada
um deles 0,2 por cento dos votos. Se este número, ou aproximado, se confirmar,
e apesar de todas as suas intenções, ganharão uma pesada derrota. Mas o tempo
de antena que conseguiram obter deve compensá-los, psicologicamente.
Marisa Matias, Edgar Silva, Paulo de Morais e Henrique Neto
Há mais quatro derrotados óbvios e a derrota de dois deles
estende-se aos dos próprios partidos de cujas entranhas, digam o que disseram
quanto à sua categoria unipessoal, saíram.
Nas eleições legislativas de Outubro do ano passado, o BE e o
PCP tiveram, respectivamente, 550 945 votos e 10,19 por cento e 445 901 votos e
8,25 por cento. Esta sondagem a que nos referimos dá a Marisa Matias (BE) uma
percentagem de 4,8 por cento e a Edgar Silva (PCP) uma percentagem de 4 por
cento.
Argumentar-se-á, como sempre, que “as sondagens valem o que
valem” mas há três factos iniludíveis: (a) se os resultados dos candidatos do
BE e do PCP nestas eleições forem inferiores aos das legislativas, terão
sofrido uma primeira derrota em termos muito simplesmente factuais; (b) a
derrota será sempre mais pesada quando se atende ao facto de a apresentação
destes candidatos ter visado a fixação dos eleitores dos dois partidos; e (c)
ambos puseram como desígnio supremo das suas candidaturas impedir a eleição do
candidato “da direita”.
Numa lógica ainda partidária, mas numa perspectiva de
formação de um partido a médio prazo com base numa eventual federação de
movimentos independentes concorrentes às eleições autárquicas, encontra-se
ainda Paulo de Morais. Com um discurso paupérrimo, este candidato apostou na
demagogia e na criação de uma imagem de caudilho messiânico. Esta sondagem
dá-lhe 1,6 por cento. Com o seu triunfalismo tão espampanante como o seu
penteado, Paulo de Morais só poderia cantar vitória se conseguisse obter uma
percentagem superior a 10 por cento. Dificilmente o conseguirá. E a sua derrota
também representará a derrota, por ter tentado federá-los, capturando os seus
eleitores, dos movimentos independentes.
Henrique Neto, o empresário do PS que o PS renegou, ficará
também entre os últimos lugares. Apresentou-se com um projecto de base
individual, com uma campanha estruturada mas os seus potenciais eleitores (à
direita e à esquerda) poderão preferir os seus candidatos “naturais”. A
sondagem do “Expresso” dá-lhe 1,1 por cento. O resultado não deve ser muito
melhor.
Sampaio da Nóvoa, Maria de Belém e o PS
O PS é e será o grande derrotado destas eleições presidenciais e já o foi logo à partida.
Por um simples e básico motivo: o segundo maior partido do
leque partidário português, o partido do actual governo (que conquistou por um
golpe de Estado parlamentar) e o maior partido da “esquerda” não conseguiu ter
um candidato único, nem tão pouco apresentar-se unido, contra o candidato único
da “direita”.
Depois deste ponto de partida, tão trágico como caricato, a
situação ainda se agravou. O PS “costista” cristalizou-se em torno de Sampaio
da Nóvoa e a restante oposição interna apoiou Maria de Belém. E não se pouparam
nas críticas.
O resultado não poderá deixar de ser obviamente mau: a
sondagem que temos vindo a citar indica que Sampaio da Nóvoa terá 16,6 por
cento dos votos e que Maria de Belém ficará com 16,3 por cento. Os resultados
das legislativas de há três meses deram ao PS unido 1 174 730 votos e 32,33 por
cento na repartição dos votos. Poderá haver quem diga, se os votos dos dois
candidatos do PS ultrapassarem estes valores (o que só por hipótese se pode ter
como provável), que o partido de Costa não sai derrotado das presidenciais. Mas
sai. Basta, aliás, que nenhum dos seus candidatos não tenha conseguido chegar à
Presidência da República.
Esta divisão, onde a “nomenklatura” costista disfarça mal o
apoio e o incentivo do seu secretário-geral a Sampaio da Nóvoa, vai ter consequências
internas.
A oposição (ou oposições) ao actual secretário-geral e
primeiro-ministro não se tem dado a muitas ousadias desde o golpe de Estado
parlamentar e, salvo se houver uma crise que ponha em causa o governo “das
esquerdas”, vai esperar por uma melhor oportunidade para contar espingardas e
voltá-las contra Costa. Se não forem dizimados na “guerra fria” que deverá
seguir-se, hão de apresentar-se um dia a combate.
A divisão Sampaio da Nóvoa/Maria de Belém é, apenas, uma das
munições que serão utilizadas num partido que demonstrou, no assalto ao poder,
que já não respeita os valores da democracia.
Estas eleições presidenciais só são boas para o PS se o
conseguirem trazer, mesmo que num processo conturbado, para o seio da
democracia.
O que dá maior peso a essa vitória pessoal são três
pormenores reveladores: por um lado, esteve no terreno quase sem contar com os
aparelhos dos partidos que, em termos eleitorais, são a sua base “natural”; por
outro lado, pôs todos os restantes candidatos partidarizados a criticarem-no
praticamente todos os dias (as críticas generalizadas, algumas vezes
demagógicas, devem ter contribuído mais para a sua notoriedade e para o
vitimizarem do que para lhe retirarem votantes); e, finalmente, criou o deserto
à sua volta – não apareceu mais nenhum candidato “da direita” ou “do
centro-direita” (a imprensa nunca se entendeu nesta classificação taxinómica).
Todas as sondagens, todas elas, dão Marcelo Rebelo de Sousa
como eleito logo à 1.ª volta ou, na pior das hipóteses, eleito à 2.ª volta.
Mesmo numa 2.ª volta, não se vê como o número dos eleitores
dos restantes nove, e mais os “zombies” que poderão despertar nessa altura,
pode sobrepor-se aos votantes iniciais de Marcelo e aos que compreendam qual o
mal menor.
Vitorioso em toda esta fase inicial, Marcelo Rebelo de Sousa,
a ganhar as eleições, e não apenas por ser esse o seu ambiente político, dará
também uma vitória ao PSD, ao CDS e a todos os cidadãos que, tendo ou não
votado nestes partidos em Outubro, receiam (e com razão) o abismo financeiro e
económico para onde o actual governo do golpismo parlamentar nos empurra.
Precisamos todos (mesmo os que não querem votar em Marcelo
Rebelo de Sousa) de um pouco de bom senso e de racionalismo político e
constitucional na Presidência da República e não de mais flibusteiros.
Se Marcelo Rebelo de Sousa ganhar as eleições presidenciais,
a sua vitória é também a nossa e a do País.
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