Do blogue Porta-Livros, uma apreciação a reter sobre "Vermelho da Cor do Sangue"
Eis na íntegra uma apreciação de Rui Azeredo, no seu blogue Porta-Livros, sobre "Vermelho da Cor do Sangue":
Já o disse (ou escrevi) e não me canso de o repetir que fazem falta em Portugal policiais do estilo dos criados por Pedro Garcia Rosado. Contemporâneos, urbanos, despretensiosos, realistas, ou seja, que geram uma identificação e um vínculo com o leitor, que ali vê reflectidas nas páginas a realidade que vê nas páginas dos jornais e, principalmente, nas televisões.As personagens de Pedro Garcia Rosado são pessoas “reais”, não há ali super-heróis, ou super-detectives, com um poder e perspicácia acima da média. O que ali vemos (lemos) é um retrato realista da nossa sociedade.Em Vermelho da Cor do Sangue (editado em 2011 pela ASA) a fórmula repete-se (e ainda bem que assim é), pelo que podemos deleitar-nos com um belo policial, cheio de ritmo, ao nível do que se faz “lá fora” dentro do género. Não há aqui as melancolias do ser português que tantas vezes são retratadas nos “nossos livros”. A essas “melancolias” ninguém lhes tira o valor e o interesse, naturalmente, mas é bom ter alternativas que nos permitam tão só ler um policial menos reflexivo e mais pragmático, mais, digamos assim… realista, mais… notícia de jornal ou de telejornal. Não se pense, contudo, que isso implica ser menos profundo ou trabalhado (ou, sequer, pior escrito), nada disso, só é apresentado de uma forma diferente, mais consentânea, em meu entender, com as características atribuídas ao género. E isso não é novidade em Pedro Garcia Rosado, pelo menos para quem (como eu) já leu as obras A Cidade do Medo (que, tal como Vermelho da Cor do Sangue, integra a colecção Não Matarás) e Crimes Solitários.Em Vermelho Cor de Sangue reencontramos personagens já nossas conhecidas, tanto do lado dos “bons” como dos “maus”, se bem que esta distinção básica de géneros seja muito volúvel. Na sequência de um “simples” roubo de jóias é revelado um segredo há muito guardado (desde 1975 e envolvendo os comunistas portugueses e da União Soviética), o que espoleta uma sequência de eventos que vai afectar uma série de figuras bem colocadas na sociedade portuguesa. Um passaporte retirado desse cofre torna-se o objecto preferido de muita gente, desde as autoridades ao seu antigo dono e a outros implicados, pois veio desenterrar um caso antigo de desvio de verbas que vieram a sustentar negócios que estariam na base de fortunas de alguns “respeitáveis” que, entre os princípios ideológicos e a fortuna material, optaram por esta última.O enredo está bem tecido e apesar de haver muitas ligações e interligações entre personagens, o leitor nunca se perde, tendo ainda “tempo” para apreciar os problemas comuns do dia a dia de alguns dos protagonistas, tão parecidos com os nossos e bem retratados por Garcia Rosado.É, assim, um excelente retrato da sociedade portuguesa que, embora passado na actualidade, nos faz também regressar aos animados e agitados anos pós-25 de Abril, um momento histórico aqui bem aproveitado e descrito pelo escritor, destacando que muitas vezes não eram só as motivações políticas que orientavam os comportamentos.
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