Já aqui me referi ao que é possível, e racional, designar por "pensamento único" e que se traduz pela imposição, entusiasticamente transmitida pela maior parte da imprensa, dos modelos de pensamento e de opinião decretados por uma autoridade única com o respectivo condicionamento da opinião pública.
Se a aplicação de medidas coercivas à população eventualmente desobediente é um passo dessa imposição, a limitação da expressão de opiniões contrárias ao pensamento único é uma decisão política que os Estados podem tomar e que vai contra tudo o que é a definição de democracia tal como ela é concebida na União Europeia. E se a limitação das opiniões não for suficiente, o melhor é metê-los na cadeia. É o corolário lógico.
À partida, não se esperaria que a imprensa fosse tão longe no apelo e no apoio à repressão das ideias. Mas hoje já há quem o faça.
José António Saraiva, arquitecto de formação e jornalista quase por acaso, dá hoje esse passo no jornal "Nascer do Sol", acusando três oficiais-generais de seguirem a mesma "cartilha", "cartilha" essa que é o regime de Vladimir Putin.
Dois deles (Agostinho Costa e Carlos Branco) são ódios de estimação do arquitecto, que não os deixa pensarem, e dizerem, que, como tantas vezes acontece, pode haver outros suspeitos, além de Putin, se o chefe do grupo Wagner tiver sido assassinado. E afirma (adeus, jornalismo, que ele já sabe tudo...) que Putin foi mesmo o assassino. Pelo caminho, ataca também um terceiro oficial (Mendes Dias), que também não se livra de ser acusado de ser favorável a Putin... apesar do que disse na entrevista que concedeu ao próprio "Nascer do Sol" em Agosto do ano passado.
Já apreciei a independência de raciocínio de José António Saraiva e muito do que tinha escrito no "Sol", que é agora "Nascer do Sol". Mas o que agora faz é exactamente igual ao que faziam as estruturas repressivas do Estado Novo, acusando os dissidentes do regime de serem "comunistas" e, com isso, e sempre que possível, entregando-os à PIDE/DGS.
Para José António Saraiva, Agostinho Costa, Carlos Branco e Mendes Dias não podem ter opiniões que divirjam do pensamento único e, se tiverem, numa primeira instância, devem ser condenados por delito de opinião e, depois, talvez presos.
Havemos de chegar a essa fase, provavelmente. Para começar, a este ponto já chegámos: o ataque, de puro recorte fascista, do ex-democrata Saraiva. Faz-lhe falta a PIDE/DGS para silenciar os terríveis "pró-russos".
Tenho sido, até agora, comprador, mais do que leitor, do "Sol/Nascer do Sol", agora acabou: não compro mais. Hão de ter, decerto, quem lhes dê mais dinheiro do que os 4€ que lhes tenho oferecido por semana, para ainda estarem no mercado...
Uma nota pessoal - Conheço, pessoalmente, o major-general Carlos Branco há cerca de quarenta anos. É um homem íntegro, inteligente, sabedor, conhecedor das circunstâncias da guerra e da paz e com quem é extremamente agradável conversar e debater. Não sei, para utilizar a terminologia do arquitecto, qual é a sua "cartilha", mas sei que, pela sua formação, Carlos Branco fundamenta bem o que diz e considero as suas intervenções televisivas esclarecedoras e bem informadas. E não vejo nelas, por todos os motivos, matéria de que, em geral, discorde.
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