“Ora, aí está um desafio para comentadores e jornalistas que pretendam ser isentos: se querem usar o termo ‘geringonça’ para se referirem aos acordos de esquerda arranjem também um para os partidos de direita. Ou talvez fosse mais adequado guardarem as graçolas para os humoristas.”
Esta frase, recente de dias, é de Estrela Serrano no seu blogue Vai e Vem. A autora desta recomendação doutoral foi assessora de Mário Soares e é dada no Twitter como “professora, investigadora de média, jornalismo, comunicação institucional, comunicação política”, sem a parte da assessoria.
Talvez não seja necessário ir mais longe e procurar outros exemplos (que os há, por aí, embora de ascendência menos ilustre) da tendência que está a generalizar-se de começar a condicionar os jornalistas nas suas apreciações do governo da tríade PS-BE-PCP.
A questão, neste caso, foi a da “geringonça”, designação aplicada por Vasco Pulido Valente ao actual governo e depois popularizada por Paulo Portas. A palavra caiu no goto de muita gente e é usada com alguma liberalidade, naturalmente com maior gosto por parte de quem não consegue ser apoiante do Governo e do seu chefe.
Ao ler o texto da distinta criatura, pensei que ele fosse terminar por uma recomendação que tecnicamente até seria correcta: ponham aspas na geringonça. Ou seja, se é notícia, ponham aspas; se é opinião… chamem-lhe o que quiserem. Ou mesmo, segundo a moda actual, “alegada geringonça”. E se é legítimo pedir “isenção” aos jornalistas (objectividade seria no entanto mais rigoroso), já é muito mais discutível exigi-la aos que vendem não jornalismo mas opinião: os comentadores.
Estrela Serrano não é uma estreia, no entanto. O actual chefe do Governo atacou, antes das eleições, dois jornalistas, um por SMS e o outro em directo na televisão. E nota-se que, estranhamente, muitos procedimentos governamentais (que se fossem do anterior governo desencadeariam notícias e opiniões incandescentes) são hoje passados em branco com uma inocência virginal de estarrecer.
O aumento de emboscada dos preços dos combustíveis, as contradições entre tudo o que o PS foi dizendo e o que este governo quer fazer ou a ocultação da entrada de uma empresa chinesa na TAP são três exemplos de um muro de silêncio que, na realidade, não só corresponde aos desejos de Estrela Serrano como à velha cumplicidade entre António Costa e alguns sectores da imprensa, passando pelas admoestações públicas (e privadas?) deste último.
E, nisto, o PS está sozinho? Não, o seu aliado n.º 1 também se cala por conveniência política.
O BE, que quando crescer quer ser o PS, tem na sua herança genética o controlo da imprensa e da opinião que não lhes agradam na sua versão trotzkista - maoísta. E o PCP, que já deixou de tentar perceber a sua herança genética e que se revê agora nesse bastião da democracia que é a Coreia do Norte, como se percebe pelo “Avante!”, também alinha (como sempre alinhou) no controlo da verdade a que outros têm direito.
Se tudo isto não se resolver entretanto (a queda do Governo e a sua substituição por qualquer coisa que seja, pelo menos, “melhorzinha”), ainda vamos acordar um dia sob o jugo de uma versão “soft porn” de Kim Jong-il.
Sem comentários:
Enviar um comentário