Por volta das onze e meia de segunda-feira, quando as luzes se apagaram, estava no ginásio que frequento.
Tendo terminado um treino de bicicleta, passei a um Pilates mais personalizado (penalizado que estou pela opção dos dirigentes da coisa de fornecerem uma versão rotineira de Pilates tipo "ginástica sénior" durante toda a semana). O apagão não me surpreendeu logo (já estou habituado, desde que vim para esta região, aos apagões da EDP/e-Redes), mas comecei a ficar inquieto ao perceber a sua dimensão: não era só esta região, era o país todo, era também Espanha...
A internet, no telemóvel, começou a ficar com interrupções, ao contrário das ligações telefónicas. Terminado o treino e verificada a impossibilidade de tomar banho, mesmo de água fria, e sem outras informações, decidi pôr de lado o que queria fazer e regressar a casa.
Pelo caminho, e depois já em casa (onde me resignei a um banho frio), consegui perceber pela rádio, nos carros, o que estava a acontecer. Mas, como toda a gente, não consegui perceber o motivo do gigantesco apagão.
Por entre as quebras, cada vez mais acentuadas, do serviço de internet, consegui aceder episodicamente a alguns sites da imprensa oficial. O Facebook ia funcionando, mas pouco mais dizia. Pelo rádio de um dos carros, que ficou no lado de dentro do portão, fui apanhando fragmentos de informação. E em todas estas fontes fui encontrando explicações... que não explicavam nada: um incêndio em instalações eléctricas espanholas, um "fenómeno extremo" meteorológico, ciberterrorismo (russo, claro), uma experiência concebida para mudar o comportamento social dos cidadãos. E criaturas, com postos e galões diversos, a acumularem maus presságios e perspectivas catastrofistas.
Sob a ameaça de passarmos a noite à escuras e já condenado à luz das velas, fui fazer o jantar no forno a lenha, apesar de ter fogão a gás, e jantámos no exterior, beneficiando até da temperatura mais amena do dia.
Por volta das 20h30 avistei uma luz fixa no conjunto urbano de Caldas da Rainha (que é visível de casa). Não quis acreditar que fosse uma luz eléctrica. Mas depois, pela janela da cozinha, a luz regressou. A normalidade foi depois restabelecida.
Este apagão não foi o mais longo de quantos aqui sofri, desde que me mudei para esta zona rural do Oeste. Mas foi o mais inquietante. A sua dimensão exigia um esclarecimento muito rápido sobre o que acontecia. Cinco dias depois, ainda não temos esse esclarecimento. E essa ausência de uma explicação talvez seja pior do que o próprio apagão. Estamos, realmente, no reino das trevas...
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Como tudo na vida, este apagão teve o seu outro lado: uma ironia. Os entusiásticos defensores dos carros eléctricos ficaram imobilizados ou sob a ameaça de o ficarem. É aquilo a que chamam "mobilidade"!