terça-feira, 31 de dezembro de 2019

Agenda ou manada?



"Público", 1.ª página, 31.12.19, a ajudar a safar o ministro A. Santos Silva

Se parece mal dizer que a comunicação social, na sua maioria, tem uma agenda política (pró-"Geringonça"), será melhor dizer que o que move a comunicação social, na sua maioria, é uma lógica de manada?

domingo, 29 de dezembro de 2019

E de repente...





… Ei-las, sem aviso, as duas temporadas completas de "Mayans M.C." na HBO. Já tinha visto a primeira, vejo agora a segunda e até me surpreendo: não é "Sons of Anarchy", faltando-nos a empatia com personagens que só agora começamos a conhecer e faltando o quadro de uma obra maior da literatura ("Hamlet"), mas acaba por entusiasmar. 
Os seus "showrunners" Kurt Sutter (que não continua) e Elgin James fizeram um bom trabalho.
(E, pode concluir-se, a HBO anda a comprar tudo o que pode, ou quase, para poder rivalizar com a Netflix, onde, pelo menos em Portugal, ainda se pode ver, e rever, "Sons of Anarchy".)



Ler jornais já não é saber mais (71): quando nós sabemos todos mais do que eles

O panorama da televisão alterou-se rapidamente, mais ou menos por volta do começo do ano 2000 quando nela começaram a aparecer histórias, argumentistas, realizadores, produtores, actores e actrizes de primeira linha e, sobretudo, uma muito maior maleabilidade de tempo e de tolerância para abordar assuntos que teriam de ser abreviados ou diminuídos no cinema do "mainstream" e em grande parte do cinema "independente".
A imprensa nacional começa a percebê-lo (e mal) nesta altura e começam a aparecer balanços e opiniões que primam pelo essencial: uma ignorância quase absoluta de muito do que tem sido exibido na nova televisão do século XXI. 
Entre o formato do "press release" e os solilóquios de quem parece ter saído do berço a meio da "Guerra dois Tronos", ninguém escapa. 
E o resultado, mais do que constrangedor, é assustador: a ignorância é descarada. 
E desnecessária: porque, deste lado, sabemos todos muito mais do que eles.

quarta-feira, 25 de dezembro de 2019

Caldas da Rainha, Natal, 2019



O Natal não seria Natal sem os extraordinários vinhos da Quinta da Fata. Como, aliás, todas as melhores ocasiões em que, nos meus domínios, escolho eu o vinho. 

terça-feira, 24 de dezembro de 2019

Caldas da Rainha, Natal, 2019



Há quem pense, e quem diga, que eu, aqui, só "digo mal". Não é verdade. E, voltando costas ao Natal do comércio e da Câmara Municipal, e aos inúmeros "reizinhos" locais e e respectivas cortes de idiotas presunçosos, aproveito para a época para dizer que neste concelho tenho encontrado pessoas e entidades que merecem o devido destaque e a quem aproveito para desejar Boas Festas: a mercearia Aldeia Rural, a empresa de comércio automóvel Auto M. Caldas, o ginásio Balance Club (e, nele, a inspiradora Cláudia Vieira), a empresa de reparações Electrólise, a empresa de contabilidade Fragata dos Números (e o rigoroso e sabedor Jorge Barja da Silva), o Hospital Veterinário Central (e a sua directora, Sofia Almendra), a pastelaria Machado, os restaurantes Naco na Pedra (de António Flores), O Recanto (de Maria e José Fialho) e Solar dos Amigos e a loja de jornais e revistas (e artes) Vogal.
A todos Boas Festas e os cumprimentos sinceros deste vosso cliente.

domingo, 22 de dezembro de 2019

Podridão




Azares




Nesta casa, cuja construção parece estar quase concluída, começaram a pintar alguns frisos e rebordos de azul. 
A certa altura, quando chegaram a esta zona do muro, tiveram azar: ou a tinta não presta, ou a chuva caiu com demasiada intensidade ou… qualquer outra coisa.
A solução será, supõe-se, pintar (de branco) o que já havia sido pintado (de branco)?
Seja como for, é uma situação bizarra.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Alerta!: há Quinta da Fata no "cash & carry" Meio Cheio

Este Touriga Nacional de 2010 (Garrafeira) 
é um dos melhores vinhos tintos que bebi em toda a minha vida

Da Quinta da Fata (Vilar Seco, Nelas, no coração do Dão) têm saído os melhores vinhos tintos e brancos que conheço. São, no entanto, difíceis de encontrar, até porque se trata de produções limitadas e de vinhos feitos apenas com as uvas da própria quinta.
Descobri-os agora à venda no "cash & carry" Meio Cheio, na Tornada, aqui em Caldas da Rainha. 
Ainda têm à venda garrafas de dois vinhos tintos extraordinários que já estão esgotados na origem (o Conde de Vilar Seco, de 2010, e o Reserva de 2014), além de lançamentos mais recentes.
O que neste blogue já escrevi sobre a Quinta da Fata pode ser encontrado aqui.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Quando do ocaso português só restou a alheira


Em 1492 os judeus foram expulsos do reino de Espanha, tendo passado a fronteira para Portugal, onde puderam ficar até 1497. Nessa altura, foram obrigados pelo rei português D. Manuel I a converterem-se ao cristianismo ou a saírem do outro reino da Península Ibérica. Em 1532 o seu sucessor, D. João III, proibiu os judeus que ficaram em Portugal de deixarem o país. Em 1536 a Inquisição instalou-se em Portugal. As perseguições e os assassinatos já tinham começado antes: as autoridades desconfiavam dos convertidos e atacavam os que apenas fingiam que se tinham convertido.
O historiador inglês Simon Schama narra, na sua monumental e magnífica “História dos Judeus” (dois volumes até agora, em edição portuguesa da Temas e Debates/Círculo de Leitores, tradução minha), o caminho de sofrimento, mas também de engenho, dos judeus portugueses. E destaca dois pormenores: um que é comum às muitas perseguições que tiveram os judeus por alvo e outro que é uma das grandes causas do ocaso português logo a partir do século XV.
Os judeus que optaram pelo comércio fora dos seus países beneficiaram de uma situação excepcional: uma rede de contactos no Oriente e em África, com pessoas que falavam a mesma língua, que tinham a mesma cultura e a mesma religião. Não havia barreiras a vencer e os muitos negócios a que se dedicaram tendiam a correr muito bem. O resultado enriqueceu muitas famílias (e convém ter presente que houve redes de ajuda das famílias ricas aos muitos judeus pobres que iam fugindo dos infernos cristãos). O empréstimo de dinheiro estava proibido aos cristãos. Mas não estava proibido aos judeus, e os reis ocidentais não estavam proibidos de pedir empréstimos para financiar os seus exércitos e as suas próprias cortes. O pior era pagar. E a opção foi a versão medieval da bravata “fazer tremer as pernas aos banqueiros alemães” (do século XXI português) e do Holocausto alemão (do século XX europeu): expulsar ou eliminar os judeus a quem deviam dinheiro. E, com eles, todos os outros.
A descrição que Simon Schama faz da fuga dos judeus portugueses é comovente e exaltante. De Portugal saíram, como puderam, pessoas do povo, mas também banqueiros, médicos, cientistas, eruditos. Tendo Antuérpia como primeiro porto de abrigo, e a ajuda das famílias mais ricas, os judeus saídos de Portugal foram para a Alemanha e para o Oriente, até à Turquia.
Não sei se alguém poderá algum dia fazer, ou se ela até já foi feita, contabilizar de uma forma ou de outra o muito que se perdeu em Portugal da chamada “massa crítica” dessa época. O saber, a ciência, a economia e a medicina praticamente desapareceram. Entre o começo da perda do seu Império, a conquista espanhola, os desmandos da Inquisição e a fuga e o assassinato dos judeus, Portugal entrou num ocaso intelectual e social do qual, verdadeiramente, nunca saiu.
Pode dizer-se, de certa forma, que do desastre só se salvou uma coisa: um pormenor gastronómico. A alheira.
Não comendo carne de porco por imperativos religiosos, os judeus que se instalaram em Portugal no final do século XV não preparavam nem comiam os enchidos, habitualmente feitos com carne de porco. Era o suficiente para se denunciarem, quando as malhas da repressão se apertavam. A alheira foi a solução: a mistura de ingredientes dentro da tripa podia incluir todas as carnes… menos a de porco. E, desse modo, já podiam comer as alheiras.
O princípio da alheira manteve-se até hoje e, nessa perspetiva, é um dos enchidos nacionais de maior criatividade. Porco, aves, caça… até bacalhau e legumes, ou vegetais (sim, já há alheiras para vegetarianos), fazem parte do conjunto de componentes desta iguaria.
Bem feita e bem cozinhada, a alheira é excelente. E a sua confecção tão simples contrasta com o toque de imaginação que esteve na sua origem.
É corrente fritá-la (um corte fino longitudinal permite que a fritura lhe faça saltar a pele) e servi-la com ovo estrelado e batatas fritas, mas há melhor maneira de a cozinhar.
Eis uma sugestão, leitor: enfie um palito transversalmente em cada extremidade, junto ao pequeno anel de metal (um processo quase infalível para evitar que a tripa rebente) e mergulhe a alheira em água que, estando a aquecer, ainda não começou a ferver; deixe-a cozer por alguns minutos em lume brando; deixe-a esfriar e depois, cortada em rodelas (convém estar fria para não se desfazer), pode levá-la ao forno. Ligeiramente assada, é óptima com grelos salteados e batatinhas também assadas.
E, ao apreciá-la, lembre-se de que ela é, na sua simplicidade, um símbolo de sobrevivência e de triunfo sobre a adversidade de um povo que, expulso de muitos países, reencontrou, com todas as dificuldades, a pátria que podia ser, e é, sua.



Notas de prova


Paço dos Cunhas/Nature - Tinto 2013 - DOC Dão
Touriga Nacional e Aragonez
Paço de Santar (Santar)
13,5% vol.
(Biológico, sem estágio em barrica)
Muito bom.

domingo, 15 de dezembro de 2019

Ler jornais já não é saber mais (70): deitar dinheiro à rua?!

Olhe à sua volta, leitor, onde há um agrupamento, menor ou maior de outras pessoas. No supermercado, no consultório, no café, no restaurante, nos transportes públicos, no ginásio, no cinema, na rua, à mesa do restaurante…
O que é que as outras pessoas estão a fazer? A olhar para o telemóvel, a percorrer a superfície do ecrã com um dedo. E pouco interessa a idade: fazem todas o mesmo. Desde que tenham um telemóvel "smart".
Estamos a falar das "redes sociais" e, em concreto, do Facebook. Nesta rede circulam rumores, comentários, notícias falsas, notícias verdadeiras actuais, notícias verdadeiras que já não são válidas. Há um fluxo de informação que preenche uma parte considerável da curiosidade que as pessoas, em geral, têm pelo mundo.

*



Quando abro o computador e o "browser", aparece-me uma página inicial do que poderão ser consideradas notícias que é o "meu" "feed de notícias". Não tenho memória de alguma vez ter visto no "feed" alguma "notícia" que me interessasse. E a maior parte delas, a começar pelo futebol, nem me interessam.
Ao alcance de um clic estão hoje "jornais" e jornais "on line", sites de notícias copiadas e outros com versões próprias do que a imprensa já disse. 
Ao alcance de um clic está hoje, praticamente, o mundo todo, pelo Google ou por qualquer outro motor de busca.
Isto, por muito mau que seja (e é!), é o que está hoje ao dispor de toda a gente em todo o lado. Depois há as televisões e alguma coisa (em geral, má) além do futebol.
E há os jornais. Um, em papel, ainda é gratuito e não é nacional. Os outros são, em teoria, nacionais e pagos. E quem é que os compra?
Pois, o problema está aí: ninguém. 

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A televisão (pelo serviço de TDT ou pelos "pacotes", que incluem serviço telefónico e internet) entra-nos em casa, as notícias misturam-se com as "notícias" no Facebook e em muitos sites ditos jornalísticos e, nos órgãos de comunicação a sério, como o "Observador" ou o "Expresso Diário") a percentagem de utilizadores pagos deve ser diminuta.
Sem dinheiro de vendas, sem dinheiro proveniente da venda de publicidade, sem as receitas dos anúncios classificados (à excepção, talvez, do "Correio da Manhã"), com os profissionais veteranos afastados, despedidos ou reduzidos a posições de chefia burocratizadas, o que resta? O jornalismo estatístico da máquina de calcular que serve para manchetes e títulos de primeira página delirantes e de leitura difícil e mais lenta. No polo oposto, o jornalismo de investigação extinguiu-se.
E as revistas? As que se querem "informativas" (as "news magazines") também perdem compradores e nem as suas migrações pelos domínios dos guias turísticos as salvam. Aparentemente, as revistas "côr de rosa" são as únicas que sobrevivem.
Neste quadro, a hipótese de o Estado vir a apoiar financeiramente é um erro, uma estupidez e um desperdício.
Não é a atirar com dinheiro para resolver problemas laborais, pagar a fornecedores ou assegurar salários que faz renascer o jornalismo profissional e competente. 
Compreende-se o desespero da associação do sector e do grupo que detém o "Expresso" (que, recorde-se, já teve de vender património), mas estamos num mercado livre e, se os jornais e os jornalistas não sabem reinventar-se, atirar-lhes com dinheiro só serve para adiar a extinção.
A única excepção deverá ser a dos jornais regionais, que têm alguma utilidade, apesar de serem muito débeis em tudo, até na qualidade. Vendidos por assinatura, na maior parte dos casos, deviam poder beneficiar do regime de "porte pago". 
Ir além disto é deitar dinheiro à rua.