quarta-feira, 29 de outubro de 2014

A limitação castradora dos "thrillers" clericais


Onze anos antes de "O Código Da Vinci" o ser,
 já "O Quinto Evangelho" o era
 
Imaginemos que a sociedade humana, tal como a conhecemos, era composta por seres humanos possuidores de um factor de cura que os tornava imunes a qualquer tipo de agressão física como, por exemplo, a personagem de BD Wolverine, com a possibilidade extra de se regenerarem a partir de uma simples fragmento de ADN. Não haveria bala, lâmina afiada, explosão, veneno, pancada, fosse o que fosse, capaz de matar alguém.
E onde os seres humanos não pudessem ser mortos, morreria outro elemento da vida humana, o "thriller". O homicídio, o tabu supremo, desapareceria e, com ele, a literatura policial.
Porque ela nunca poderia viver de histórias em que uma pessoa fosse morta para depois regressar à vida, inviabilizando tudo, inclusivamente a descoberta do assassino, que o deixaria de ser.
Os "thrillers" históricos de temática clerical têm esse problema: qual é o mistério? Bom, verdadeiramente nenhum.
Os textos bíblicos, oficiais e apócrifos, e os textos sagrados de outras religiões já têm mistérios suficientes para construir histórias enigmáticas mas no domínio da ficção científica.
Esse foi um dos aspectos que mais me irritou quando li (em 2005 ou em 2006) "O Código Da Vinci": qual era o mistério em torno do Santo Graal que deveria esclarecer-se no fim da história? Nenhum. O Santo Graal existe ou não existe. E daqui não se pode sair.
O que pode ser interessante é imaginar uma origem extraterrestre, por exemplo. Mas isso já empurraria a história para o domínio da ficção científica.
O problema dos "thrillers" clericais é este: a sua limitação castradora de ficarem prisioneiros nos limites das convenções religiosas, das interpretações bíblicas (mas mais do Novo Testamento, mais "normalizado") às particularidades do Vaticano em versão Kremlin.
Os seus seguidores, que tiveram desde pequeninos alguma educação cristã, devem delirar com a sugestão de pecado que as especulações do género lhes trazem.
Tendo lido "O Código Da Vinci", traduzi um romance alemão interessante em 2007, intitulado "Das fünfte Evangelium", de Phillipp Vandenberg ("O Quinto Evangelho", ed. Quid Novi).
Publicado em 1993, "Das fünfte Evangelium" era demasiado parecido com "O Código Da Vinci" (que saiu em 1994). A literatura e a cultura alemãs são mal conhecidas fora da Alemanha e é natural que as semelhanças não tenham sido muito notadas.
E se não posso falar em plágio (compreendendo, coitados, que os autores do género também não têm muito por onde escolher), o caso de "Das fünfte Evangelium" só confirmou a péssima opinião que me deixou "O Código Da Vinci". E foi o suficiente para me vacinar contra o género e contra os imitadores de Dan Brown que pela sua vacuidade, verdade seja dita, também não consegue ser imitado senão por quem também nunca teve estilo.



A demanda do Santo Graal é muito mais interessante
quando é conduzida por Indiana Jones





1 comentário:

Mil Folhas disse...

Experimentei ler o Código . Li 5 capítulos e parei, não me cativou, até porque já tinha visto o filme, e não me estava mesmo a apetecer ler algo que não seria uma novidade. JRS, não me lembro exactamente qual o livro. Li 4 capítulos. Fechei o livro, e pense: que raio eu já li isto antes.
E de facto, yup, eu já tinha lido aquilo antes.
Acho que o único autor do género que leio é o Luís Miguel Rocha. Não li todos, apenas 2 e é um género que até gostei. Precisamente por não ser católica gosto de ler sobre o tema... aliás... quanto mais leio, mais convicta fico de que a religião é uma grande caca!

Beijinho